Mil Novecentos e Oitenta e Quatro, George Orwell
Por Inês Sousa
Winston Smith vive na Pista 1, anteriormente chamada de Inglaterra, no ano de 1984 (segundo as suas próprias contas, pois não há certezas do ano em que se vive). A Pista 1 faz parte da Oceânia, um superpaís composto pelas antigas América, Inglaterra, Sul de África e Austrália, dominado por um regime totalitário governado pelo Grande Irmão, cuja figura está em todo o lado, literalmente, a “ver” todos os habitantes. Winston trabalha no Ministério da Verdade e a sua função é reescrever e alterar dados de acordo com o interesse do Partido, transformando a mentira em verdade e a verdade em mentira. No entanto, Winston está secretamente revoltado contra o regime, e apesar de ser vigiado 24 horas por dia pelo telecrã (uma tela que permite ver e ser visto, e que está presente em todos os lares) e de saber que vai muito provavelmente ser “vaporizado” pelo Partido, começa a escrever às escondidas um diário, actividade ilegal.
O Partido asfixia os cidadãos, servindo-se da novilíngua, linguagem cujo objectivo é “apagar” a mente das pessoas de modo a que percam o poder de pensamento próprio; do “duplopensar” (quando algo pode ser verdade e mentira ao mesmo tempo) ou da Polícia do Pensamento, que tem como função detectar quando alguém comete “crimideia” (um pensamento contra o regime, logo ilegal) e levá-lo para o Quarto 101, onde os “criminosos” são confrontados com as suas fobias. Em suma, o Partido tem controlo total sobre a mente dos cidadãos, e Winston descobre que a revolta é fomentada pelo próprio Partido.
Valeu a pena ler esta obra porque apesar de ter sido escrita há mais de 60 anos, continua actual. “Mil Novecentos e Oitenta e Quatro” chega a ser assustador; apesar de, felizmente, retratar algo que nunca aconteceu, e de ter sido inspirado pelo regime comunista Soviético, já desaparecido, é impossível não compararmos certos pormenores com a realidade política de hoje. Orwell escreve com uma mestria que nos faz precisar de parar de ler de vez em quando para podermos respirar fundo, como se estivéssemos a viver o pesadelo asfixiante descrito na obra; e é extraordinário como conseguiu prever tão genialmente o futuro, relativamente às novas tecnologias e ao controlo que exercem sobre nós. Ficamos com a impressão que Orwell escreveu “Mil Novecentos e Oitenta e Quatro” enquanto olhava por uma janela para o futuro, apesar de o objectivo ter sido criticar o passado…
Esta obra fez-me reflectir sobre o poder que a prole pode ter sobre um governo, e ao mesmo tempo, a facilidade com que pode ser enganada e controlada. Afinal, Orwell descreve o papel vazio do diário e a caneta como algo saudável, inofensivo, até belo, representando a liberdade e o pensamento próprio, e a tecnologia como algo malévolo que nos controla e vigia, uma ferramenta para sermos enganados e usados por algo superior. Apesar de soar a “teoria da conspiração”, penso que seria uma boa ideia mantermo-nos atentos ao que nos rodeia; o que num momento parece inofensivo pode revelar-se uma ferramenta poderosa de controlo. Quando escreveu este livro, Orwell criou uma sociedade terrível, e, 60 anos depois, apercebemo-nos que o que era apenas uma história tornou-se em parte realidade: a “era dos telecrãs” já esteve bem mais longe do que está hoje, e o “duplopensar” já engana os mais distraídos ou inocentes…
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